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domingo, 21 de abril de 2013

Redução da maioridade penal: O cinismo dos apelos para um estado vingador

Trazemos à analise dos leitores a aguda questão da criminalidade envolvendo menores de 18 anos e discurso da redução da maioridade penal. Setores da sociedade, pessoas que tiveram parentes vitimados por menores, envolvidos emocionalmente, apelam para o Congresso Nacional intentando a reforma da Legislação com a finalidade de o Estado Brasileiro apenar menores envolvidos na violência criminal como se fossem adultos.

Discute-se se o modelo penal brasileiro não deveria ser flexibilizado, permitindo-se aos juízes aferirem se determinado indivíduo menor reúne caracteres bio- psicológicos que permitam e assim, assentando-se em modelo de penal aberto, no qual os critérios de definição de culpa e responsabilidade ficam a cargo do julgador e não da Lei, responsabilizados criminalmente como se maiores fossem e lançados nas enxovias do estado.

De fato, o envolvimento de menores, quase crianças com a violência criminal horripilam, quando vemos a divulgação reiterada pelas tevês das mortes de indivíduos quase ainda crianças por outras crianças ou mesmo quando vemos adolescentes portando fuzis e pistolas assaltarem bancos.
Porém é necessário que a indignação como fatos que soam horripilantes dêem ensejo à uma realidade de surgimento da dignidade e não a discurso do escapismo e do cinismo.

É preciso que se diga, sem temor ou tremor, que a violência que grassa no seio dos estratos juvenis do nosso país só estarrece aqueles que não pensam ou não têm olhos de ver e mirar que a sociedade brasileira de hoje é o reflexo do seu passado.

Uma sociedade que se construiu baseada na escravidão, que com a urbanização escorraçou seus pobres para as periferias das grandes cidades, que sempre tratou seres humanos como coisas e, uma vez, inaugurando um modelo de sociedade de consumo, sem erigir a maioria dos seus cidadãos à condição de consumidores, se vê prisioneira de ideologia que divulga que verdadeiro cidadão é aquele que consome, uma sociedade corroída por esse amoralismo evidentemente é uma sociedade estruturalmente violenta e basicamente perversa.

Atravessamos toda nossa historia, desde os dias do descobrimento até os dias atuais navegando nas águas turvas da perversão. E, hoje quando, supostamente, abençoados pelo desenvolvimento e redução das desigualdades, a podridão do amoralismo que nos guiou até aqui se revela na violência daqueles que não se vêem também abençoados pelos desenvolvimento, excluídos, portanto, da sociedade de consumo.

É o que está acontecendo aqui e agora no nosso país. As nossas crianças e adolescentes excluídos da sociedade da consumo ou prisioneiros do modelo aético e amoral que elege como abençoados aqueles "homens de bem" que se veste bem e que podem desfilar nos seus possantes veículos querem eles se
inserir nessa sociedade e se necessário não se preocupam em arrobarem as portas, ou seja, praticarem atos de violência horripilantes.

Diante do quadro, da realidade social de violência, cinicamente se apela para o surgimento de um Estado Vingador. Tais apelos revelam o quanto somos covardes. A covardia com todas as suas máscaras e disfarces adentra os estúdios de rádios, as redações e as tevês. Não se tem a desfaçatez de defender os grupos de extermínios e justiçamentos que tragam a vida de milhares de jovens e crianças anualmente no país, não obstante, se quer enfeitar o morticínio através da modificação do modelo penal para que as
mortes de menores não sejam nos supostos enfrentamentos, mas por doenças nas enxovias do Estado.

Enquanto isso, cinicamente, nos recusamos a construção de uma sociedade alicerçada na dignidade e na decência, na efetivação ECA, da Constituição Cidadã de 1988. Não precisamos das cruzadas dos que antes de terem os filhos mortos por menores não expressavam indignação contra o amoralismo do nosso modelo social e se quedavam calados como sócios do modelo de sociedade amoral que construímos e queremos a todo custo manter.

O discurso da redução da maioridade penal pode até ser bem intencionado, mas lembremos que de boas intenções o inferno está cheio. Necessitamos é de humanos que se recusem a pactuar com as iniqüidades sociais. Que não admitam um modelo social que não contemple a esperança e a felicidade das maiorias.

Indignação contra atos de violência perpetrados por menores apenas quando temos os nossos entes queridos arrancados do mundo dos vivos não passa de cinismo.

Ao invés de travarmos cruzadas pela redução da maioridade penal, ingressemos em cruzadas pela construção de uma sociedade inclusiva, onde o valor do ser humano não seja medido por sua capacidade do consumo, onde não prevaleça a ideologia divulgada pela grande mídia de que você é mais humano quando veste "PRADA" ou desfila de "CAMARO AMARELO", fazendo aflorar os instintos bestiais daqueles que uma vez excluídos da sociedade de consumo, para se incluírem não crêem em qualquer outra utopia destronadas pela emergência do fim da história senão a da violência criminal, conforme profetizada no insuperável romance Laranja Mecânica, pelo escritor inglês Anthony Burgess.

MIGUEL DOS SANTOS CERQUEIRA, Defensor Público, Coordenador do Núcleo de Defesa de Direitos Humanos e Promoção da Inclusão Social da Defensoria Pública do Estado de Sergipe. Juntamente com militantes da JOC, fundou a Casa da Juventude Trabalhadora e o primeiro curso pré-vestibular destinado exclusivamente a pobres e moradores de periferia em Feira de Santana, o Curso Samora Machel, no bairro Queimadinha. Além de tais atividades, publicou livros de poesias e, ainda, poesias e contos em jornais com o Correio da Bahia e JORNAL FEIRA HOJE. E-MAIL: migueladvocate@folha.com.br

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