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segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Mortes de moradores de rua: Seria essa a verdadeira política de higienização e limpeza urbana?


Miguel dos Santos Cerqueira 

Há muito tempo moradores de rua vêm sendo vitimas de assassinatos em todo o Brasil. Alguns são mortos com tiros na cabeça, outros com pauladas, e alguns outros vítimas de pedradas. Também tem aqueles que além de serem vítimas de tiros, são queimados, além dos que são envenenados.


A crescente de violência contra essa população vulnerável parece não ter fim. A sociedade, o seu segmento que não foi tragado pela bestialidade, pelo espetáculo e pelo conformismo, se estarrece, também as entidades que militam na proteção dos direitos humanos.

A política de higienização das cidades, dos centros urbanos, que antes parecia ter com alvos delinquentes polichinelos parece que tem agora um novo alvo. Tratam-se daqueles indivíduos fedorentos, aqueles que exalam mau odor e conspurcam as nossas narinas asseadas e que tem avidez por preciosas fragrâncias. O esmolar dessa gente de aparência fantasmagórica parece agredir as nossas retinas de bem estalados.

Assim, se não podemos solucionar o problema através de mudanças estruturais, mas almejamos tão somente o asseio e as vitrines da sociedade de consumo, por nos faltar a audácia da solução final, como tanto perseguiam os nazistas em relação aos judeus, usamos de mão invisíveis, as vezes não tão invisíveis, vamos conseguindo que sejam exterminados aos poucos, e, por fim, teremos higienizadas as nossas urbes desses seres indesejáveis.

Nas décadas de 70 e 80 do recente século passado a política de extermínio em massa de moradores de ruas se restringia a cidade de São Paulo. Lembrando-se que anteriormente, quando do Governo de Carlos Lacerda e Sandra Cavalcante, na antiga Guanabara se inaugurou nos tempos modernos, pós Império e República Velha, a  política de higienização das cidades, não mais por meio do enxotamento para as favelas, mas através do extermínio de mendigos, dos moradores de rua. Nos anos 90 do século passado a matança no atacado e no varejo, sobretudo perpetrada por jovens de classe média, se estendeu para o Distrito Federal, para cidade   de Brasília, mas também para a grande Vitória e cidades do seu entorno.

Agora, já no século 21, quando um surto de suposta bonança econômica parece se espraiar por todo o país, com a consolidação da classe média e dos seus valores como hegemônicos e postulados ideológicos, o fascismo macaqueado de liberalismo; com ele a política de higienização, a mortandade de moradores de ruas se espalha por todo o país. Sergipe, a sua capital Aracaju não seria o bastião da resistência, até por que tem a sua economia assentada no turismo e, portanto, necessita da cidade 'LIMPA”. 

Não é por por menos que, segundo dados do Comitê Nacional de Monitoramento da População em Situação de Rua, vinculado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, no ano passado, ano de 2011, foram três as mortes de moradores de rua. Recentemente, na quinta-feira, 09 de agosto de 2012, ocorreu mais uma morte em um dos bairros da cidade, essa com características de extremada violência, a besta ou as bestas sanguinárias ou seriam os higienizadores que atacaram uma moradora de rua em um dos bairros da nossa capital não foram econômicos no uso da violência.

É fato que essa política de higienização, alimentada por conformismo e cinismo de um lado de um lado e pela intolerância e ideologia fascista travestida de liberalismo ou democracia social de outro, vem num crescendo. Alguns dos crimes são encomendados por comerciantes, esses inconformados por assistirem a presença de moradores de ruas que algumas vezes se drogam e se prostituem nas imediações dos seus estabelecimentos, fazendo com que percam clientes, esses, muitas vezes não menos prostitutos que aqueloutros. 

Outros crimes são perpetrados por policiais, uma vez que prevalece no meio da segurança pública e privada a ideologia da prevenção e da defesa social, pensam os que cometem tais crimes que eliminando moradores de rua estão a eliminar prováveis delinquentes e protegendo a sociedade. Outros assassinatos são realizados por senhores e jovens de classe média, alguns que se escondem por detrás de vistosos ternos e elegantes vestidos e até, cinicamente, se fazendo fazer passar por defensores de Direitos Humanos ou de causas sociais, discursam em eventos e comícios em defesa dos direitos e das liberdades, mas que se recusam a atender essas pessoas nos seus gabinetes ou desinfetam as mãos com álcool ao lhes trocar apertos de mão, esses assassinam na surdina uma vez que a presença de homens com as vestes em frangalhos e a carne aberta em chagas denuncia a insustentabilidade de um modelo de organização social que não pretendem ver alterado.

Os dados sobre crimes contra a população de rua são precários, uma vez que ninguém se importa ou que se importar com quem exala fedor, com quem não tem nome, quem não tem família, enfim, quem não pode consumir ou frequentar shopping center. A maioria dos crimes contra moradores de rua não saem nos jornais, pois é espécie de notícia que não vende, uma vez que a própria notícia e mercadoria, produto de consumo.

É inconteste que na contramão da afirmação dos valores da classe média, da pequena burguesia urbana, com seus preconceitos e intolerância, haja vista que os valores da classe média, conforme dizia o famoso cineasta italiano Pier Paolo Pasolini, são os valores do novo fascismo, vem ascendendo uma política de higienização e de extermínio. Por outro lado, as políticas de garantia dos direitos dos moradores em situação de rua, que não se restringem a mendigos e usuários de crack, mas que inclui catadores e até vendedores ambulantes, não sai do papel.

Em 23 de dezembro de 2009, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva editou o Decreto 7.053, que instituiu a Política Nacional para a População em Situação de Rua. O texto prevê a integração das políticas públicas em cada nível de governo, a implantação de centros de defesa dos direitos humanos para a população em situação de rua, canais de comunicação para o recebimento de denúncias de violência e o acesso dessas pessoas aos benefícios previdenciários e assistenciais e aos programas de transferência de renda. Não obstante, apenas em alguns Estados, em alguns municípios onde há uma presença forte das Pastorais Católicas voltadas para os moradores de rua há uma efetivação de tais políticas.

Infelizmente, enquanto predomina o engodo e a demagogia nos órgãos e esferas que deveriam efetivar políticas na efetivação dos direitos das pessoas em situação de rua, por temerem se contaminar com fétido e com as supostas doenças que possam portar,  as ruas não têm sido apenas passarela para exibição dos valores da sociedade consumo, mas também o palco de covardes assassinatos de pessoas que por não possuírem um teto para se abrigar são forçadas a viver nas inseguras ruas do nosso país.



Miguel dos Santos Cerqueira – Defensor Público, Titular da 1ª Defensoria Pública Especial Cível de Aracaju, Coordenador do Núcleo de Defesa de Direitos Humanos da Defensoria.

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